Por Renata Moura
O Rio Grande do Norte vai receber financiamento da Fundação americana Bill & Melinda Gates – e recursos federais – para criação de um indicador no Brasil que pode ajudar a prevenir casos de “quase morte” e óbitos na gravidez, parto e pós-parto.
A proposta foi apresentada por pesquisadores do Instituto Santos Dumont (ISD) e anunciada nesta terça-feira (1º) como uma das 12 contempladas entre 233 inscritas no edital “Ciência de dados para melhorar a saúde materno-infantil, saúde da mulher e saúde da criança no Brasil” – lançado em agosto pela Fundação Bill & Melinda Gates em conjunto com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e o Departamento de Ciência e Tecnologia da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde.
Do total de R$ 5,5 milhões previstos no edital, R$ 137 mil serão destinados ao Instituto.
Os trabalhos que culminarão no indicador serão desenvolvidos ao longo de 18 meses, com início previsto em 2021.
INOVAÇÃO
A proposta do ISD teve mérito reconhecido e tema avaliado pelo Comitê de Relevância Social que analisou os projetos como “extremamente relevante para o SUS”, segundo parecer que o CNPQ divulgou com o resultado.
Referência regional em saúde materno-infantil, da pessoa com deficiência, em neurociências e neuroengenharia, o Instituto propõe usar inteligência artificial para identificar corretamente e prever casos de “near-miss materno” – como são chamados em inglês os registros de mulheres que quase morrem na gravidez, parto ou pós-parto em decorrência de complicações graves por hemorragia, hipertensão ou infecção, por exemplo.
“Esses números não são conhecidos com precisão no Brasil. Eles são subnotificados, embora sejam indicadores importantes da qualidade da saúde e a ciência reconheça que é preciso estudá-los”, dizem Abner Rodrigues e Reginaldo Freitas Júnior, pesquisadores que desenvolveram a proposta.
Cientista da computação e doutor em Bioinformática com pesquisas nas áreas de inteligência artificial, processamento de sinais e análise de séries temporais, Rodrigues vai coordenar o projeto com apoio de Freitas Júnior, doutor em Ciências Médicas, especialista em medicina fetal e instrutor nacional da Estratégia Zero Morte Materna por Hemorragia Pós-parto da Organização Pan-Americana da Saúde e Ministério da Saúde, além de diretor-geral do Instituto.
“A inovação da proposta está em criar um sistema baseado no uso de um conjunto de algoritmos de aprendizagem de máquina para mapear e classificar os casos de near miss-materno já reconhecidos e aqueles que passam despercebidos pelos registros oficiais. Vamos buscar padrões em grandes bases de dados públicas para chegar ao indicador que será disponibilizado ao poder público. A expectativa é que ele sirva para analisar como está a atenção básica no município ou estado nessa área, uma ferramenta para tomada de decisão por melhorias na qualidade de vida e assistência às famílias”.
DADOS
O sistema proposto pelo ISD vai classificar os casos com base em registros de pacientes disponíveis, por exemplo, no Sistema de Informações de Nascidos Vivos (Sinasc), no Sistema de Informações Hospitalares (SIH) e no Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), mantidos pelo governo federal. No caso do SIM, os dados referentes à mortalidade materna serão usados para identificar padrões semelhantes aos observados nos registros de near-miss.
Após concluírem o levantamento e chegarem aos indicadores que buscam, os pesquisadores planejam como próximo passo incorporar ao sistema de inteligência artificial informações socioeconômicas da região das pacientes, considerando uma das variáveis apontadas em estudos diversos como diretamente relacionadas à quase morte materna: a pobreza.
“Dessa forma espera-se obter um valor mais preciso e, principalmente, mais rápido, do número de near-miss materno em uma região. Com essa informação, será possível para os tomadores de decisão de políticas públicas de saúde avaliarem o impacto das ações e políticas executadas e planejarem as intervenções necessárias na rede pública de saúde”, acrescentam os pesquisadores.
O trabalho será desenvolvido com a participação de alunos do programa de mestrado em Neuroengenharia do Instituto Internacional de Neurociências Edmond e Lily Safra do ISD (IIN-ELS/ISD), que está com inscrições abertas até 17 de janeiro. Quatro bolsas serão destinadas ao projeto. O Instituto Santos Dumont é uma Organização Social vinculada ao Ministério da Educação e tem sede em Macaíba, no Rio Grande do Norte.