Desgoverno socioambiental

marina90

O governo Temer e sua base de apoio no Congresso Nacional continua e aprofunda o retrocesso socioambiental, como mostram exemplos recentes, com o corte de 43% no orçamento do Ministério do Meio Ambiente justamente num momento de forte elevação do desmatamento da Amazônia. O crescimento do desmatamento em 60% nos últimos dois anos, além das consequências desastrosas para conservação ambiental, compromete sobremaneira o compromisso assumido pelo governo brasileiro com o Acordo de Paris em reduzir o desmatamento em 80% até 2020.
1 – O Congresso levou apenas 48 horas para aprovar as Medidas Provisórias 756 e 758, enviadas pelo Palácio do Planalto. Juntas, elas representam a redução 1,1 milhão de hectares de unidades de conservação na Amazônia e na Mata Atlântica. A medida provisória 756, ao retalhar e reduzir um conjunto de unidades de conservação, como alterar os limites da Floresta Nacional do Jamanxim e da Reserva Biológica Nascentes da Serra do Cachimbo, libera a grilagem de 660 mil hectares de terras públicas que foram alvo de desmatamento e haviam sido ilegalmente ocupadas, além de poderem ser exploradas economicamente já que não são mais áreas protegidas. Também foi aprovada a medida provisória 759, sobre regularização fundiária e urbana, que permite a legalização massiva de áreas públicas griladas de até 2.500 hectares. O desmatamento de Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal não é mais motivo de reversão da área para a União.
2 – A tentativa apressada de privatizar o respeitado sistema de monitoramento da Amazônia realizado pelo INPE, em um período de contenção de despesas, gera suspeitas, sobretudo em um momento em que os dados revelam o aumento expressivo do desmatamento.
3 – Houve a tentativa de votação atropelada, reagendada para a próxima semana, de um Projeto de Lei em discussão na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara que dispensa o licenciamento para atividades agropecuárias, silvicultura, obras para o abastecimento de água, dragagem de portos, reforma de rodovias e aeroportos. Na prática, não haverá mais necessidade de licenciamento para pavimentar, por exemplo, a rodovia BR-319 (Manaus-Porto Velho), inserida em uma das áreas mais preservadas da Amazônia.
4 – Há uma proposta de Projeto de Lei que busca fazer com que trabalhadores rurais possam receber remuneração de “qualquer espécie”, no lugar do salário, alimentos ou habitação, por exemplo. Mas a designação genérica abre caminhos para interpretações sombrias que acabam com a garantia trabalhista do salário em troca do trabalho no campo.
5 – O relatório da CPI da FUNAI pediu o indiciamento de 88 pessoas e criminaliza defensores dos direitos indígenas e do direito ao acesso à terra como organizações da sociedade civil, antropólogos, lideranças indígenas, procuradores e agentes públicos.
A ausência, no debate público, da agenda socioambiental para a vida do país demonstra que, infelizmente, ainda estamos presos a uma visão ultrapassada de que ecologia e economia são separadas e opostas. Essa visão, mais economicista que econômica e mais politiqueira que política, é responsável pelo desmonte sistêmico e acelerado dos órgãos e das políticas socioambientais, conquistados arduamente durante quase três décadas de mobilização intensa da sociedade.

Marina Silva – Porta Voz Nacional da REDE Sustentabilidade

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